terça-feira, 6 de maio de 2014

Temple Grandin, em São Paulo: suas ideias já estão mudando a indústria e a pecuária brasileiras?

                     

A norte-americana Temple Grandin em palestra na faculdade FMU, em São Paulo.
/Fotos de Ricardo Osman



      A cientista norte-americana Temple Grandin, uma das maiores autoridades mundiais no estudo de bem-estar animal, com papel relevante nas novas instalações da indústria de carne nos Estados Unidos, esteve nesta semana em São Paulo e deu uma boa notícia aos brasileiros. Em palestra na faculdade FMU (Campus da Avenida Santo Amaro) na tarde de segunda-feira, dia 5 de maio, Temple Grandin deixou claro que já há produtores brasileiros de carne e/ou criadores de gado interessados em seu trabalho e adotando, na prática, suas ideias para as plantas de abatedouros. Ela informou que vem prestando consultoria no Brasil e descreveu uma visita: "Era uma planta (industrial) boa, mas com muita gritaria e choques elétricos (aplicados aos animais, para eles andarem nos corredores)",disse Temple Grandin. Ela não citou o nome do cliente, mas revelou que reprovou a gritaria e os choques, e que apresentou suas ideias de baixo estresse dos animais para essa planta industrial. Refez o projeto.  
     Com pesquisas reconhecidas em todo o mundo, a especialista em bem-estar animal defendeu o uso de "vídeo" nesta empresa brasileira e em outras indústrias de produção de carne para monitorar a ação dos funcionários e evitar erros. Segundo afirmou, hábitos antigos, como o choque elétrico, podem retornar aos abatedouros por meio dos trabalhadores que resistem às mudanças propostas por ela no manejo dos animais, mudanças que consideram o comportamento dos bichos e suas emoções, como medo e raiva. 
          
           A PALESTRA 

        Na palestra, Temple Grandin  revelou que a rede do McDonald's  nos Estados Unidos passou a exigir de todos os seus fornecedores de carne a adoção de suas ideias, o que levou a mudanças nas plantas industrias e no manejo do gado.  "Há um caminho  longo a percorrer", disse Temple à plateia no auditório lotado da FMU, em São Paulo. "Mas quando comecei a trabalhar com o conceito de bem-estar na década de 1970 a situação era muito ruim. Hoje, a cultura está mudando, e o produtor percebe que a cultura do bem-estar é também lucrativa."
      Ela reapresentou seus conceitos que mostram como produtores ignoravam (e muitos ignoram ainda) as necessidades dos animais, que tanto lucro rendem, e os novos métodos de abate menos cruéis. No auditório, ela exibiu fotos que mostram corredores de abatedouros escuros, com chão liso e molhado e vários objetos como mangueiras de água pendurados nas paredes. Mas o gado tem medo de sombras, mangueiras e evita entrar em locais escuros, como observou a especialista. Tudo isso leva ao estresse e a situações de maus-tratos. Temple falou, sobretudo, sobre a emoção dos animais e de como podemos tratá-los com dignidade e respeito. No Brasil, o calor na maior parte do País e o transporte são itens que merecem atenção especial.
    A palestra na FMU foi possível graças aos esforços da professora Andrea Bueno Ribeiro, que se dedica à área de bem-estar animal, e do apoio da professora Paula Bastos e da coordenadora do curso de Medicina Veterinária, Ana Claudia Balda.

    

       PRODUÇÃO BRASILEIRA

  •        O Brasil é um dos principais produtores de carne bovina do mundo e, segundo o Ministério da Agricultura, é desde 2008 o maior exportador de carne bovina, com grandes perspectivas para o futuro. Só que mercados como os dos Estados Unidos e da Europa são hoje exigentes em relação ao bem-estar dos animais, e não apenas em relação aos cuidados sanitários. No momento, a indústria de produção de carne bovina brasileira busca alcançar um patamar de primeiro mundo  para aumentar as exportações. Talvez, dentre os países emergentes do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o Brasil seja o que venha obter melhores resultados em termos de bem-estar animal e manejo correto na pecuária de corte na próxima década. Quem melhor poderá falar sobre isso será a própria indústria, hoje concentrada nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, que já dispõe de especialistas, recursos financeiros e tecnológicos para modernizar a planta industrial.        
       QUEM É TEMPLE GRANDIN

  •        Temple Grandin  nasceu nos Estados Unidos e ganhou notoriedade por ter uma compreensão excepcional dos animais e de suas emoções. Ela é autista e desde a adolescência gosta dos animais. Elaborou trabalhos inovadores na área do bem-estar animal. Quando era criança, seus pais chegaram a ouvir de um médico que ela teria dificuldade para falar. Entretanto, Temple Grandin conseguiu superar dificuldades e vencer na Academia: ela é Bacharel em Psicologia pelo Franklin Pierce College e tem mestrado em Zootecnia na Universidade Estadual do Arizona, e é Ph.D. em Zootecnia pela Universidade de Illinois. No momento, ministra cursos na Universidade Estadual do Colorado a respeito de comportamento de rebanhos e projetos de instalação, além de prestar consultoria em manejo, instalações e cuidado de animais em todo o mundo. Para saber mais: www.grandin.com




LIVRO –  Temple Grandin é autora (com Catherine Johnson) do livro "O Bem-Estar dos Animais - proposta de uma vida melhor para todos os bichos", publicado no Brasil pela editora Rocco. Recomendamos a leitura deste livro que fala sobre cães, gatos, bois, cavalos e porcos. Suas revelações e pesquisas nos fazem refletir sobre vários aspectos de nossa convivência com esses animais. Citamos um trecho:
"Os cães são muito diferentes de vários outros animais com que trabalhamos porque são hipersociais e hipersensíveis a tudo o que fazemos. A sintonia dos cães com as pessoas é tamanha que são os únicos animais capazes de seguir o olhar ou o dedo que aponta numa direção e entender que lá está guardado um alimento. Os lobos não são capazes disso, nem os chimpanzés."

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